Formação do psicólogo: entre o mercado de trabalho e a criticidade política

Crescentemente percebe-se nos relatos de estudantes de Psicologia a necessidade de que os currículos da graduação tenham conteúdos de ordem pragmática, para aumentar as possibilidades de profissionalização e compreensão das ferramentas que lhes dêem condições de terem inserção no mercado de trabalho. No livro “A formação do psicólogo: Clínica, Social e Mercado”, assinado por João Ferreira Neto (2004), o autor aponta que, se antes a preocupação dos formandos estava voltada para questões epistemológicas, com fins de se aprofundarem nas abordagens teórico-técnicas para a formação clínica, hoje o que se vê são estudantes mais tocados pela questão do mercado de trabalho.

Vale dizer que numa realidade em que a atuação profissional está cada vez mais competitiva e especializada, os estudantes se deparam com um mercado que, desde o início da formação, deve ser visto como um problema a ser enfrentado. Para os formadores, de maneira semelhante, o mercado também é um problema, manifestado na forma de exigências de formação continuada e produtividade desenfreada. Ambos os atores, formandos e formadores, experimentam profundamente os efeitos da competitividade infatigável e dos padrões de qualidade que estão em constante variação.

 No país, a Psicologia enquanto profissão foi regulamentada em 1962, e as publicações do CFP, da década de 1980, sobre o perfil dos psicólogos brasileiros, mostraram que a formação destes profissionais era marcada fortemente pela via extra-universitária. Todavia, nos últimos tempos, particularmente a partir dos anos 2000, as Instituições de Ensino Superior tem expandido sua atuação para abranger diversos níveis de pós-graduação e atividades de extensão na busca de aperfeiçoamento e especialização. Assim, pode-se dizer que a Universidade está cada vez mais paramentada para se mostrar atrelada ao mercado de trabalho. De agora em diante, o Ensino Superior está convocado a alinhar-se com a realidade social brasileira, entendida como os interesses de investimento dos setores privados da sociedade.

O que o autor quer dizer durante suas arguições é que não há mais a possibilidade de ignorar o mercado mundial como uma realidade presente na qual estamos inseridos e da qual dependemos. Contudo, isso não quer dizer que a relação dos profissionais frente ao mercado deva ser de submissão sem alternativas, pelo contrário, é preciso que se estabeleça com ele uma relação crítica. A Universidade deu um salto ao abranger, nas suas diretrizes curriculares, experiências de produção de conhecimento por meio da associação entre ensino, pesquisa e extensão. Essa concepção de currículo não mais está centrada somente na grade de disciplinas e na transmissão de conteúdos padronizados.

Há que se ter em vista, todavia, que esse passo traz consigo uma tendência de tudo isso ser traduzido numa formação puramente tecnicista de um profissional moldável de acordo com as modulações do mercado, “reduzindo as possibilidades de inflexões diferentes e as apropriações por parte de um projeto de formação crítico, assentado numa perspectiva política bem definida”, expõe João Ferreira Neto (2004).

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Fonte: Ferreira Neto, João. (2004). A formação do psicólogo: Clínica, Social e Mercado. Belo Horizonte: Fumec/FCH.


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